domingo, 8 de junho de 2008

A INFLUÊNCIA DOS EUA NO TELEJORNALISMO "GLOBAL"

Desde o seu surgimento, a Tv Globo saiu à frente das demais emissoras de televisão brasileiras. Com grande capital estrangeiro investido na emissora – graças ao acordo com o grupo norte-americano Time-Life – mesmo quando esse tipo de investimento era proibido por lei, a rede Globo teve todo o suporte financeiro e técnico para tornar-se a preferência nacional.

No telejornalismo não é diferente. Apesar das constantes críticas feitas à emissora ao longo dos anos, os repórteres da Rede Globo são considerados exemplo de qualidade há muito tempo. O curioso é que, quando saem da emissora, esses mesmos repórteres parecem “desvalorizar” no mercado de trabalho. A pergunta que surge é: os repórteres estão na Rede Globo porque são bons, ou são bons porque estão na Rede Globo? A emissora parece valorizar os profissionais, tanto que o sonho de grande parte dos estudantes de jornalismo do país é trabalhar nessa grande máquina do jornalismo brasileiro.

Ao analisar o jornalismo feito pela Rede Globo, não é difícil perceber que a emissora parece seguir a mesma cartilha rigidamente desde o começo. Conhecendo um pouco de história, é possível constatar que muito do que o jornalismo “Global” – que é sinônimo de jornalismo brasileiro – é hoje, deve-se ao jornalismo norte-americano.

A televisão da Europa e dos EUA possuem características diferentes, visto que são resultados de modelos diferentes. O telejornalismo brasileiro, no entanto, importou o que há de mais duvidoso no modelo norte-americano. Com sua escola de jornalismo "clean", ou seja, "limpo", os EUA ficaram a anos-luz do jornalismo engajado e crítico praticado na Europa. Como não é de "bom tom" tomar posições a olhos vistos, tomaram-se os mitos da imparcialidade e da objetividade como verdades inabaláveis até hoje.

O mundo “globalizado” poderia muito bem ser chamado de mundo “americanizado”. A influência dos EUA não está só na televisão brasileira, mas em toda parte, seja por meio de grandes marcas comerciais, seja por modismos, culinária e estilo de vida. A televisão é o grande meio de comunicação nos Estados Unidos, e no Brasil o contexto não é diferente. A grande massa brasileira não tem acesso aos jornais impressos, seja por limitação financeira ou por falta de acesso à educação de qualidade. Portanto a televisão acaba sendo a “janela para o mundo” de grande parte da população.

Na comparação entre a produção brasileira de telejornal e as produções norte-americanas, percebe-se que o jornalismo brasileiro, tomado pela cartilha do Tio Sam, trabalha sempre a com a defesa da objetividade e imparcialidade. O jornalismo brasileiro absorveu muito do jornalismo norte-americano também em relação aos enfoques dados nas matérias. Em ambos, há uma supervalorização de personalidades e a publicação dos fatos sem uma análise profunda. É um tipo de jornalismo até então diferente do jornalismo europeu, que tem uma abordagem mais pedagógica e uma interpretação analítica e intelectualizada dos fatos.

O Jornal Nacional é referência de telejornal no Brasil. Ele foi o primeiro a transmitir seu sinal do norte ao sul do país em rede nacional, graças ao apoio do governo militar. Além disso, outra marca do telejornal em relação aos outros programas jornalísticos da Tv, sempre foi a preocupação com o aprimoramento técnico, de modo a se consolidar como modelo de telejornalismo brasileiro. Sempre no mesmo horário, sempre com a mesma duração, sempre antes da novela das oito, que passa às nove. O Jornal Nacional consolidou o formato asséptico de telejornalismo, e as demais emissoras, na expectativa de conseguir uma fatia da audiência, segue o modelo tão exageradamente a ponto de produzir clones, como é o caso do Jornal da Record.

Em nome do Padrão Global, orientações absolutamente burocráticas, que pretendem dar ao jornalismo um tratamento objetivo, são aceitas como regra. Como se Jornalismo fosse uma ciência exata. São exemplos disso orientações como o estabelecimento do tempo de duração que uma sonora deve ter em um VT, assim como o tempo total de uma matéria - independentemente da a complexidade do assunto - para que não se comprometa o ritmo da reportagem. O tempo não pára e o jornalismo é feito em tempo real, e todas as matérias devem ser cronometradas. Há muita informação para transmitir e pouco tempo a perder com análises. O público está esperando pela novela ou pela próxima atração.

Como demais características , o telejornalismo brasileiro tem nítida aproximação com a teledramaturgia. O noticiário é praticamente uma novela da vida real. É preciso criar um vínculo com o telespectador, algo que prenda sua atenção. Por outro lado, os telejornais brasileiros são incapazes de fazer uma boa explanação ou contextualização das notícias. Quase não se conecta a informação de hoje com uma informação dada meses antes. A ênfase no prazer estético e no apelo emocional em detrimento das notícias é outra característica. A forma como as informações são hierarquizadas também foi aprendida com os americanos. O dado mais importante é a solução do conflito. Até mesmo o encerramento dos jornalísticos foi importado: o tradicional enquadramento final dos dois âncoras, arrumando seus roteiros e conversando entre si, indica que os telespectadores devem voltar à vida normal.

O fato de ainda tomarmos a Rede Globo como o exemplo máximo a ser seguido indica que faltam opções. O telejornalismo no Brasil ainda é pobre, e vale ressaltar, é cópia da cópia norte-americana. A realidade brasileira é outra, e isso dipensa maiores explicações. O estômago brasileiro se acostumou ao enlatado norte-americano. Os estudantes de jornalismo devem ficar atentos e evitar cair nessa cilada. Não é preciso mais do mesmo. É preciso encontrar uma identidade própria, um modelo novo, soluções criativas. Uma pausa nessa influência desmedida não faria mal. E parar de responder ao "Boa noite" do Jornal Nacional também não.

por Paula Bucar
(paula.bucar@gmail.com)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

"REDE GLOBO: 40 ANOS DE PODER E HEGEMONIA" VALERIO BRITTOS (org.)

REFERÊNCIAS VIRTUAIS

http://www.bocc.ubi.pt/pag/piccinin-fabiana-telejornalismo-americano-europeu.pdf

http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2005/resumos/R0647-2.pdf